quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Paciência

Ela pede-me paciência, ao que eu lhe respondo "isto é que vai para aqui uma crise!".

domingo, 26 de dezembro de 2010

O seu cheiro.

Hoje, depois de muito tempo, não me deitei sozinho. Já me tinha esquecido da sensação. Obrigado por me avivares a memória.

sábado, 25 de dezembro de 2010

Conto de Natal (ou de Páscoa) - Prólogo

Prólogo

Deus existe e vê tudo e todos.

A frase é inteiramente verdadeira, necessitando apenas de esclarecimentos adicionais.

O céu, local situado em patamar superior ao da terra, é povoado por arcanjos e meros anjos e por Deus. Deus, tal como o homem, não fora este feito à sua imagem e semelhança, é humano e, portanto, necessita de se distrair e de descansar.  

Deus também dorme, caramba! Deus tem de dormir. E é por essas e por outras que alocou um grande grupo de habitantes celestiais, chefiado pelos mais belos arcanjos, ao controlo dos movimentos dos habitantes terrestres.

Sim, Deus está em toda a parte e tudo vê, mas também precisa de ajuda. Imaginem só o cansaço de tudo ver e ouvir e, depois de tudo ouvir e ver, discernir o que fazer, que decisões tomar, que medidas correctivas aplicar – compaginando tudo isto ainda com o cansaço provocado pela espuma dos dias. Deus é grande mas é um.

Assim, confinados num espaço sem delimitações físicas de qualquer espécie e no qual se ouvem continuamente harmoniosos e angélicos cantares (tipo canto gregoriano), encontram-se aqueles que tudo vêem. Os que tudo vêem têm por missão tudo ver e tudo escutar para depois, munidos de detalhados relatórios, esculpidos com letra comercial em alvas – lácteas mesmo – mármores, relatar superiormente as suas conclusões.

Ele – magnânimo que é – encontra sempre a solução mais justa para os casos e situações reportadas, mesmo para aquelas que à partida poderiam parecer indecifráveis para o comum dos mortais (mas também é isso que nos separa Dele), sinal de alguém que possui uma eternidade de sabedoria acumulada.   

E foi assim que, numa dessas lânguidas manhãs de Primavera, em que o sol penetra a custo por entre as nuvens altas que se amontoam no céu, Ele tomou a decisão mais importante das nossas vidas.

sábado, 18 de dezembro de 2010

Sinto-me Falta

Sinto-me falta.

Tu eras parte de mim e, quando foste, eu fui também.

Agora não sei bem quem sou nem como vou preencher o vazio que me deixei.

Sinto muito e sinto-me falta.

 

Sempre Contigo

Já fomos jovens. Sabemos como as coisas costumavam ser.

Sabemos que as pernas tremiam e que os corpos dançavam sem percebemos muito bem como, mas eles lá se entendiam. Sabemos como o peito ficava pesado e como o ar custava a entrar (e a sair). Só de nos vermos, o coração parava e batia desenfreadamente - alternadamente e sem ponto intermédio.

Tudo éramos nós e nós éramos tudo.

Não havia mais ninguém nem coisa alguma naqueles instantes. Só o calor do teu abraço, que me segurava suspenso no ar e me embalava o coração.
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Eu escrevi-lhe uma canção e ela não a  percebeu. Ou fingiu que não a percebeu.

E eu percebi, nesse instante, que não valia a pena escrever-lhe mais canções - muito embora tal epifania não tenha impedido que o tivesse continuado a fazer.

Ontem fui presentado - pelo meu amigo Gravito - com um vídeo que me fez lembrar dela.

Depois lembrei-me da outra e percebi que estou arruinado.

E depois emocionei-me com a beleza que há no mundo.

(Não necessariamente por esta ordem; até pode ter sido o caso de ter sentido tudo isto ao mesmo tempo.)

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Segurar a Chama

Há uns tempos fiz uma meia canção (porque não passou da meia dúzia de acordes) - a meias com Silver - em que se dizia:

Não vou mais segurar a chama, por ti.

Na altura, aquilo não era dito para ti, mas hoje foi.

Pena não teres ouvido.

Medo do Medo

quando estás a meu lado
não preciso ter medo do medo

agora que não estás a meu lado
eu sou o medo

ainda te hei de ver a morrer de saudades minhas.

gostava de ter coragem para te perguntar
se estás melhor assim
sem mim
mas tenho medo de ouvir um sim
de ouvir um sim

e morrer de vez.
 

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Obrigado

(já publicado noutro local)

Já estou melhor, obrigado
sei que não perguntaste
mas ainda assim gostava de te dizer;
 
Sinto-me muito melhor
quase pronto.
quase no ponto (de ebulição).

Ai, se ela viesse ao meu encontro
e me desse um desconto
eu comprava-lhe o coração


Mas ela não imagina quem eu sou
e por muito que insista
ela nunca me vai dar o que eu lhe dou.

O olhar sorumbático
e o jeito catártico
que carrego no meu peito;


Tudo isso é passado
triste como um fado
arrastado e imperfeito.


Já estou melhor, obrigado
sei que não perguntaste
mas ainda assim gostava de te dizer;


Sinto-me muito melhor
quase pronto.
quase no ponto (de ebulição).

Ai, se ela viesse ao meu encontro
e me desse um desconto
eu comprava-lhe o coração


Mas ela não imagina quem eu sou
e por muito que insista
ela nunca me vai dar o que eu lhe dou.


Porque eu amo tudo nela
e ela não ama o nada que há em mim.

Miguel de Carvalho

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Prenda de Natal

Ele viu um relógio que gostou na publicidade de uma dessas revistas.

Inacreditável a avalanche de anúncios a bens de segunda (ou terceira) necessidade que poluem as televisões e revistas na época de Natal.

Mas ele, indiferente que é, por regra, às publicidades e ao Natal, apenas gostou do relógio.

Achou, por momentos, que o objecto - ou a simples posse do objecto - o faria sentir-se melhor.

Dirigiu-se à loja, identificou a peça e disse: Quero levar aquele.

A funcionária, muito solícita sob o olhar atento da patroa, diligenciou apressadamente no sentido de lhe entregar o relógio pronto a levar.

Explicados que foram os procedimentos de troca, prazo de garantia e remoção / substituição das pilhas, aos quais ele prestou a mínima atenção necessária, a dita funcionária perguntou-lhe se era para oferecer.

Ele, que nesse instante folheava desinteressadamente um pacato catálogo de relógios que havia sido deixado na mesa que o separava da funcionária, levantou os olhos, mirou-a bem de frente e, quase de um só fôlego, disse: Sim, se não causar muito transtorno.

A frase ainda não tinha sido dita até ao fim e já a funcionária, mediante apenas o sim, retirava o papel de embrulho alusivo ao Natal da gaveta para, de seguida, acto contínuo, embrulhar a caixa do relógio. E fê-lo com um cuidado e carinho extremos, como se o presente fosse para si ou para um dos seus.


Ele saiu da loja, dirigiu-se ao carro, conduziu, saiu do carro e entrou no escritório.

Já sentado na mesa de trabalho, tirou o embrulho do saco verde que carregara em todo aquele percurso e aí abriu a sua prenda de Natal.

Gostou e fica-lhe bem.

Jovial, diz ela.

Não sabe por que razão o fez, mas deve prender-se com o facto de sentir necessidade de (re)aprender a gostar do Natal.

domingo, 12 de dezembro de 2010

Puto de Ideia

Eu não faço puto de ideia do que é que as mulheres gostam, mas sei, com pena minha e para mal dos meus pecados, o que não gostam.

Não gostam de tipos com:
-        Ligeira tendência depressiva;
-        Jeito para escrever canções;
-        Aparência mediana (nem bonito nem feio);
-        Capacidade de socialização mediana (não se destacam, mas fazem parte activa do grupo onde se encontram inseridos);
-        Grande apetite (quer por comida quer por bebida);
-        Jeito para escrever em verso;
-        Dificuldade em estabelecer limites;
-        Incapacidade crónica de cuidar de si próprios;
-        Inexplicável capacidade de antecipação de acontecimentos;
-        Sorte;
-        Capacidade para discutir sentimentos, desde que não sejam os (sentimentos) próprios;
-        Preguicite crónica;
-        As emoções escondidas bem lá dentro;
-        Um profundo sentimento de não realização profissional;
-        Falta de disponibilidade mental, porque muito absorvidos pelo seu trabalho (não obstante o item anterior);
-        Grande nível de ignorância procedimental no que toca aos relacionamentos (amorosos).

sábado, 11 de dezembro de 2010

Estudo 1 - Ana Paula

Querida Ana Paula,

Eu não te conheço bem, mas gostava. Há qualquer coisa em ti que me diz que podíamos ser bons amigos. Mas tu és tão mais interessante e senhora de ti do que eu, pobre coitado, que ainda anda a aprender a pronunciar certas palavras, como: “quero” ou “sim”.

Tu assustas-me, Ana Paula. Tens aquele jeito e aquele brilho – que se nota à distância – capazes de dizer mais com um sorriso do que eu em cinco minutos de monólogo. Metes-me medo, Ana Paula, mas fascinas-me. Sinto que precisava de te conhecer melhor. Talvez fosses capaz de me fazer esquecer.

A desilusão, minha querida, é algo que já provei em demasia. A vida não teve contemplações para comigo nesse aspecto; não me avisou, com relativa antecedência, do amargo que causa a desilusão. Não me disse: “olha, para o ano, para o mês que vem, amanhã… vais ver como elas mordem”. Elas ou ela. E eu olho para ti, Ana Paula, e para o que decidiste partilhar com o mundo, e penso: será que também já provaste desse amargo, Ana Paula?

Eu acho, Ana Paula, que, se sabes do que falo, se já provaste esse amargo, então… és capaz de me compreender. Eu tenho medo, minha querida. Medo de ouvir outra vez uma daquelas frases que marcam um tempo, uma hora, um lugar… das que são ditas a medo, para não doer tanto, mas com a consciência do mal que farão. Frases como: “tu és como um irmão para mim” ou “tu és o meu melhor amigo para sempre!” E sabes tão bem (quanto eu) que para sempre é muito tempo.

A minha ideia é a seguinte: se sabes tudo isto, se sabes como dói, não vais querer que doa nos outros, pelo menos não em mim. E se assim for, Ana Paula, então vales a pena (como eu valho a pena).

Eu não te conheço bem, já o disse. Acho mesmo que não conheço mais do que a tua imagem, o teu sorriso ou as características mais imediatas da tua pessoa. Mas deixa-me dizer-te que és fascinante. Uma mulher como tu não se interessaria por alguém como eu – é o que sinceramente acho.

É por tudo isto, Ana Paula, que gostava de te conhecer melhor. Tenho para mim que valho a pena, mesmo para uma mulher como tu. Repara: não tenho feitio para o auto-elogio, sou até bastante auto-destrutivo, mas acho que valho a pena. Mas é melhor perguntares àqueles que me rodeiam o que acham de mim. Aviso já: fá-lo com parcimónia. A maioria deles possui olhos tão generosos quanto os seus corações; tendenciosos olhos costumo dizer.

Para terminar, minha querida Ana Paula, queria dizer-te tão simplesmente que gostaria de te rever.

Do sempre teu,

Indieotta

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Love is in the air.

O amor está no ar.

É isso ou então é o cheiro a torradas queimadas. Porra... deixei queimar as torradas.

Tempo a mais dá nisto: torradas queimadas.

Durante algum tempo, fui pensando que as torradas eram seres sérios e valentes, os quais aguentavam algum tempo na torradeira sem nos fazer a desfeita de se torrarem. Mas as torradas foram feitas exactamente para esse fim, para se torrarem... Só os incautos como nós ignoram.

Sei, agora, que as torradas preferem o cheiro a queimado e o gosto a torrado. É mais fácil, de facto, deixar-se torrar, jogar pelo seguro, não dar o grande passo de sair da torradeira.

Mas quem sou eu para julgar as torradas, o homem que as deixou esturricar.